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Os muros do Moncada

Pelas veias de uma cidade saem os jovens martianos. No meio de uma festa, outra vez a possibilidade do sacrifício em prol da felicidade de todos

 

Fotocomposição: Carlos M. Perdomo Domínguez

 

Pelas veias de uma cidade saem os jovens martianos. Ao cair da noite, as luzes dos carros engolem a estrada; de vez em quando uma paragem para respirar o ar de algum povoado. Agora não se trata de ser ou não ser, mas sim onde será a coisa; a pergunta persegue-os de forma insistente de cidade em cidade. Alguns estão com sapatos de duas cores, a única calça de sair, a guayabera branca; atrás, deixam a família, uma nota muito breve de um até breve, ou um adeus pendurado da janela, como a luz cintilante de uma vela.

Já a viagem atravessa as terras orientais de Cuba; até que enfim, Santiago, o carnaval, a quinta Siboney. No meio de uma festa, outra vez a possibilidade do sacrifício em prol da felicidade de todos.

Numa pequena sala, os valentes maiores que seus fuzis, veem-se as caras todos juntos pela primeira vez. Sem tempo para dormir duas mulheres passam suas mãos pelos ombros deles e distribuem os uniformes. Depois, as palavras de Fidel Castro e o hino de Perucho Figueredo.

É domingo, 26 de Julho de 1953, Dia da Santa Ana, e daí em diante produz-se o drama de uma história: o ataque, a dispersão o sangue dos seus companheiros pelas ruas que ainda não dormiram. Uns fogem para as montanhas, outros escondem-se no matagal de um quintal desconhecido outros desafiando as barreiras de soldados na entrada de cada cidade, dissimulando o cheiro de pólvora que sai por seus poros. Talvez sintam medo, é que eles não são Aquiles, o herói lendário, com um furo no calcanhar, mas sim Hector às portas de Troia; e é difícil morrer com a vida tão nova nos pulmões, e deixar uma música sem nome nas mãos da namorada ou nos sonhos de uma mãe.

Mas conseguem vencer o medo e o ódio dos chacais. Fidel preso, erguido, olha os que sobrevivem e guarda, onde ninguém veja, a dor por aqueles que estão faltando: os olhos de Abel, os óculos, os feridos assassinados, o corpo mutilado de Boris Luis, o poeta Raúl Gómez García, já não está, e ainda continua vivo, além do verso, da fumaça e da metralha.

Na hora do julgamento, Fidel invoca o Apóstolo, Martí anda pelas salas como um anjo com uma espada de fogo e até os inimigos sentem o raro orgulho de ser cubanos. Uma língua, como um chicote no rosto do general, percorre a sala, passa pelas páginas que roubaram a dignidade humana e que reclama: terra para os desapossados, saúde para os doentes, escolas para as crianças, casa limpa para cidadãos tão mortais como a árvore, liberdade para o direito ao culto essencial de amar uns pés descalços. A martelada não é dada pelo juiz, mas sim por aquelas poderosas palavras: /Condenai-me, não importa, a história me absolverá!/.

Autor: Julio César Sanchez Guerra | informacion@granma.cu

Julho, 2020

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