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As ruas vazias de Havana prometem abraços

O silêncio, quase total, é desacostumado. Atrás das portas escuta-se, distante, o som dos programas da televisão; uma família conversa na sua varanda e aproveita o ar fresco escasso enquanto chegam as 21 horas da noite e a hora de bater palmas; o cachorro do bairro passeia com cautela pelo meio da rua, pressentindo algo raro.

Foto: Jose M. Correa

 

O silêncio, quase total, é desacostumado. Atrás das portas se escuta, distante, o som dos programas da televisão; uma família conversa em sua varanda e aproveita o ar fresco escasso enquanto chegam as 21 horas da noite e a hora de bater palmas; o cachorro do bairro passeia com cautela pelo meio da rua, pressentindo algo raro. As ruas estão vazias. Uma cidade insone teve que se deitar cedo.

Havana não costuma recuar. A qualquer hora, no mais profundo da madrugada, tem pessoas que caminham, que vivem. Somente uma doença como a Covid-19, tão sorrateira e por isso mais traiçoeira, que não deixa de matar e provocar encerros em todo o planeta, conseguiu minguar a febre havanense de mover a noite como o dia.

Foto: Jose M. Correa

 

A mítica esquina de Prado e Neptuno muito poucas vezes esteve tão deserta. 

Para a história serão guardadas as imagens que a partir de 1º de Setembro imortalizam uma capital recolhida em seus lares, com o muro da avenida beira-mar (Malecón) solitário, La Rampa dormida, a avenida San Lázaro sem carros, vizinhanças de caminhantes ausentes…

A obrigatoriedade de permanecer no lar desde as 19 horas até as cinco da manhã, ditada pelas autoridades da província, busca reduzir a mobilidade e conter o contágio, estendido já pelo território em níveis que cada manhã fazem sentir o peito apertado.

A perda de vidas humanas, a paralisia de boa parte da vida económica, cultural e desportiva, e a impossibilidade de reatar o ano lectivo escolar, são algumas das duras consequências do novo surto em Havana.

«Tristeza». «Nunca as ruas do meu bairro estiveram tão vazias, nem quando dos furacões». «Força, Havana». «Tudo isto vai passar», escreveram vários usuários das redes sociais, perante as fotos que mostram uma cidade desértica.

 

Foto: Jose M. Correa

 

Nessas mesmas plataformas, também se expressou a singularidade e beleza de um momento no qual cuidar da vida de cada cubano se torna uma causa colectiva: «Minha Havana… toque pela vida»; «Assim deve ser, pela saúde»; «Nossa Havana vai se levantar como o que é, uma cidade mágica e preciosa»; «É indispensável que nossos irmãos havanenses façam um sacrifício para poder livrar-nos deste fantasma que nos tem encurralados».

Este é um toque de recolher à irresponsabilidade, essa que acredita ser imune e acaba causando o sofrimento dos mais vulneráveis e do seu próprio. Quanto pesar na alma deve sentir quem saiba que é responsável, devido à sua negligência, por ter levado o vírus ao lar, e que isso custou a existência de um ente querido!

Havana teve que parar seu vertiginoso ritmo noturno. O rigor se impõe, sem discussão possível. Há encerros que salvam sorrisos, que prometem abraços. Voltarão a palpitar as ruas e a percorrê-las aqueles que a amam na Ilha toda e no mundo. Hoje emudece o asfalto para que, depois, seja mais seguro.

Autor: Yeilén Delgado Calvo | internet@granma.cu

setembro 11, 2020 

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