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A censura do perverso

Se a má-fé está à espreita e o mundo obscuro no qual vivemos nos rosna e mostra as presas, aposto naquele adágio que diz: a censura do perverso é o mais certeiro elogio

Foto: Arquivo

Gasto por tê-lo lido tantas vezes, continua a ser imprescindível para mim aquele livro de fábulas que ganhei de presente na minha infância. Entre os textos que contém, há um deles que diariamente me vem à cabeça advertindo-me, talvez porque estamos a viver tempos em que a sordidez se acirra e quer pela força ganhar apoiantes.

Conta que um lobo falava horrores acerca de um cachorro, adicionando à reputação do cachorro uma longa lista de impropérios. Uma raposa escutou-o e disse para os seus botões: espera que um tolo acredite em você, / cachorro que é acusado por um lobo / deve ser um cachorro íntegro.

O moral esmagador da fábula concluía dizendo: Em caso próspero ou adverso / jamais deverias de esquecer, / que é um elogio bem cumprido / a censura do perverso.

Se a má fé está à espreita e o mundo obscuro no qual vivemos nos rosna e mostra as presas, aposto naquele adágio que diz: a censura do perverso é o mais certeiro elogio. Caso assumi-lo, isso não servisse para neutralizar totalmente a calúnia, pelo menos será de grande valor tê-lo ao alcance de nossas mãos, quando a reprimenda queira macular os gestos limpos. Sob a sua égide será mais fácil tomar partido e robustecer posturas, para jamais claudicar quando o caminho escolhido esteja enfeitado com os ícones inconfundíveis do bem.

Há pessoas para as quais o equilíbrio do mundo não vai mais além dos seus sucessos pessoais, circunscritos, quase sempre, à solvência material. E tem outros que, incapazes de se perturbarem, diante das queixas do planeta, optam pela indiferença. Outros, de alma maior, calibram a cena. Sabem que não basta para estar bem o bem-estar próprio e se acolhem ao ditame martiano, que nega aos homens íntegros o direito ao repouso, enquanto houver uma obra para fazer. São esses que não aceitam aquela neutralidade da que falou Eduardo Galeano, os que se resistem aos atropelos e não aceitam o inaudito.

Extrato de notícia de autor

Autor: Madeleine Sautié | madeleine@granma.cu

Setembro, 2020

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